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quinta-feira, 29 de junho de 2023

Espera


 


No declive do tempo os anos correm...

E o tempo esmaga tudo...

Ai, ai de mim enquanto caminho...


São inúteis as palavras destes versos...

Nada entenderás...


Só quero o que me é devido...

Com licença, quero passar,

Tenho pressa de viver...

Não tenho tempo a perder...


Nesses  dias que embranquecem meus cabelos…

Ferido de silêncio duro e violento...

Com um beijo me despeço...


Eu andava à sua procura quando ainda não existias...

Sinto...

Sem planejar nenhum destino...

Que é preciso partir...

Os nossos sonhos uniram-se

talvez muito tarde...


Anda a bruma a fazer-me  medo...

Não há luar,

Não há estrelas...

Já não sei mais o quero...

Já não sei o que vejo...


Hoje, é que nada espero.

Para quê, esperar?


Sandro Paschoal Nogueira

segunda-feira, 26 de junho de 2023

Promessa de partida


 


Sangue dessa pobre alma em ferida...

Andando contemplando a lua branca e fria…


Luz que a madrugada entorna...

Há de nos devorar, talvez...

Cada amigável momento...

Além do livre pensamento...


Heróis da gargalhada... 

Eu gosto de vocês...

Grandes ironias das farsas joviais...

Dos restos de copos...

Falando besteiras e nada mais...


Com vocês sorrio...

Ah, sim, gosto de vos ver...

Da vida heróis da bofetada...

O que há mais a fazer?


E no curso veloz...

Do tempo que a tudo devora...

Eu rio sempre com desdém...

De ver o povo elouquecer...

Nas mímicas sem par...

Nas histórias a contar...

Do ato de seduzir...

Do disfarçar em cuspir...

E a qualquer um se entregar...


Assim se faça tudo...

À medida do que se ama...

Com uma promessa de partida...

A noite corre...

E quase já finda...


A vida dá-me janelas...

Que nasce na fantasia...

Um querer indiferente...

Sem perder-me...

Da maneira que assim se exista...

Ah, a opressão de tudo isto...

Que me oprime para ser feliz...


Sempre, sempre, sempre...

Oh Deus...

Ouve minhas preces...


Sandro Paschoal Nogueira

Herança


 

Herança de tudo que não sou...

Inocência do desconhecido...

Luto dos meus olhos....

Disfarçando na minh’alma a dor...


À morte que damos vida...

O sonho da terra que se pisa...

Soprem tarde os desenganos...

Dos tempos que hão de chegar...


Desejo de amor sincero...

No breve correr dos dias...

Nunca o presente é passado...

Nunca o futuro é presente...

De onde venho, poderei voltar ?


Peço ao vento que não uive e não gema tanto...

Grandes são os desertos e as almas desertas e grandes...

Hoje não me resta...

Senão saber isto...


Como a folha morta em lagos sonolentos...

Noite sussurrante de silêncios...

Como me engana...

Esse velho coração...

Como ainda desejo e sonho...

Ansiando pela ilusão...


Sandro Paschoal Nogueira

Enganos


 

O meu coração desce...

Na tua ausência como um caixão à cova…

Sob o fustigante látego do esquecimento...

De dor violenta e não tão nova...


Que apego ainda mantenho?

Alma egoísta e fraca sou...

Desventuras que ouço...

E de tudo que passou...


Todos os dias de ti ouço falar...

Novo assunto sempre aparece...

Vil gênio me atormenta e a indignação me inspira...

E o povo que me beijava...

Era o mesmo que me enganava...


E tu, tu não te abrias...

E com olhares para outros sorrias...

E cego por ti fiquei...

Das horas à sombra dos teus gestos que fiquei...


Hoje canto e choro amargamente...

E a dor, indiferente, se faz latente...

A mesa posta a tua espera continua...

Embora meu sorriso tenha sido apenas um brinquedo...

Destruído pelas mãos tuas...


Sandro Paschoal Nogueira

quinta-feira, 22 de junho de 2023

Envelhecer


 


Nada passa mais depressa que os anos...


Quando mais jovem dizia...

Que ao chegar aos vintes livre seria...

Dali pulei para os trinta...

Já aos quarenta e nada sentia...

Cheguei aos cinquenta...

Sem fazer muito esforço...

Quem diria...

Deus me permita chegar aos noventa...

E ainda ter um coração de moço...


Pensava antes que os velhos eram bobos...

E disso eu ria...

Agora bem sei e compreendo...

Os mais jovens é que o são e não se dão conta...

Assim sigo aprendendo...

Poucas coisas me surpreendem...

E outras tantas ainda me amedrontam...


O tempo risca meu rosto...

Isso é fato...

Diante o espelho...

Ocasionalmente me embaraço...


E ainda que o destino seja cruel...

Já não me engana tanto a ilusão desse véu...


Meus cabelos ficarão brancos...

Minha pele perderá o viço...

O corpo, o vigor...

Estranho esse feitiço...

De tamanho rigor...


A sabedoria, quem diria...

Torna-se minha companhia...

Lentamente...

A cada dia...

E a cada noite que se anuncia...


Nem sempre escuto o que as pessoas dizem...

Geralmente não me interessam...

Às vezes me magoam...

Agora prefiro prestar atenção no que fazem...

E não no que apregoam...


O amor nos faz envelhecer antes da hora...

Mas também nos torna jovens quando a juventude passa...

Mas a paz...

Ah a paz...

É tão acolhedora...


Qualquer um pode ser jovem...

Envelhecer é um mérito...

Tudo é questão de espírito...

E de tudo que nos envolvem...


Embora tenha Deus como companheiro...

Que amanhã  não seja ainda o dia de estar ao seu lado...

Mas na derradeira hora...

Farei parte desse céu estrelado...

E desde já ao Criador agradeço ...

Envelhecer é aprender a tudo ser muito grato...


Sandro Paschoal Nogueira

sexta-feira, 16 de junho de 2023

Leito vazio


 


Um dia, talvez, haverá novos sonhos...

Ouvirei com encanto alguém que não conheço...

Para mim será o começo de tudo...

O começo de um novo mundo...


Agora para mim já tão frio e já tão tarde...

E sem fazer nenhum alarde...

A minha alma não descansa...

Não sou nem mesmo uma lembrança...

Uma esquecida sombra que ninguém repara...


Todo o amor é desejar...

Embora se viva às avessas...

Se o tempo troteia...

E pesa como uma estrela...

Quão afortunados são os amantes...

Quão infelizes os ignorantes...


Estranha cousa esta...

A ventura de querer ver-te bem...

Mãos de renúncia...

Mãos de amargor...

Ao perder seu amor...


Semente divina...

Que só n’alma germina...

Exalta o viver...

Em doce tortura...

Ai amor...

Que sorte de quem tem você...


Repara...

Aqui eu sem luz e sem vida...

Quando, alta noite, me reclino e deito...

Clamo por ti...


No vazio do meu leito...

Só o silêncio...


Sandro Paschoal Nogueira

Pressupondo


 

Por vezes quando o tempo passa...

Em horas dentro de mim...

Passa um nada meio acontecido...

Uma saudade que não tem mais fim...


Na penumbra de minha casa...

Escondido sob o luar...

Na artéria estendida do silêncio...

No vão do patamar do tempo...

A procurar...


Pressupondo um olhar para trás...

Por tudo o que eu vi e sei...

No curso veloz da vida...

Corri, subi e voei...


Agora grito...

Para rasgar os risos que me cercam...

Insensatos...

Não me servem de consolo...

Tolos...

Inúteis...

Pueris...


Fartam-me até as coisas que não tive...

Fartam-me com tudo o que sonhei...

Fartam-me o tanto que desejei...


Outrora escalar os céus,  imaginei...

Tudo era igual...

E tudo me ruiu...

E entrei abandonado na esperança...

Entreguei -me a ela e ela me possuiu ...


Em combustão secreta...

Ao silêncio me abri...

Hoje entre as pedras procuro...

Aquilo que perdi...


Não paro...

E se necessário volto atrás...

Quantas vezes necessárias forem...

Até  reencontrar...

O que nunca esqueci...


Dizem todos que é loucura...

Bem isso eu sei...

E muito ouço e muito já ouvi...

Tenho um caminho marcado...

E se agora não encontro...

Vou procurar no passado...

Revolvendo as cinzas...

Até descobrir...


Sandro Paschoal Nogueira

quarta-feira, 7 de junho de 2023

Cansado


 


Como se o frio fosse o maior aconchego...

Enquanto a manhã vai se derramando  em multicores...

O céu parece baixo e de neblina...

Até eu venho ver se me apareço...


Essa delicadeza, cada vez mais e mais difícil...

A qual me perco...


Vida...

Não sei se entendo...

Mas pratico...


Embora esperanças minhas...

Pelo tempo desfeitas...

Ainda sonhar...

Me permito...


O que há em mim é sobretudo cansaço...

Não disto nem daquilo...

E ainda assim dizer

Deus seja louvado...


Sandro Paschoal Nogueira

Voz no vento


 


Houve um tempo...

Em que eu sonhei com as estrelas...

Por não conseguir ir até elas...

As trouxe para mim...


Não sei o mistério...

Das falas do coração...

A minha paz é ignorar...

Tanta coisa que se esquece...

Perdidas na ilusão...


Voz no vento...

Passando entre a poeira...

Se guardo algum tesouro não o prendo

Enquanto caminho sobre minhas estrelas...


Onde fica o mundo?

Os caminhos de pedras e estreitos?

Os mares, do rio seus leitos?

Onde fica o mundo dos estranhos homens sujeitos?


Porque assim deles vivo escondido...

Minha história que ninguém crê...

Que me dói não sei onde...

E nem o porquê...

Ser ou não ser eis a sorte...


O que tiver que ser será...

O que Deus desejar...


Sandro Paschoal Nogueira

Ingrato


 


Eu menti naquela hora...

E disse que não sabia...

Mas vou-lhe dizer agora...

A ingratidão pesa...

E para chegar não tem hora...


Em meio ao sol e ao riso da manhã...

Tudo isso existe...

Tudo isso é triste...


Nesse engano das horas...

Como alguém que tivesse esquecido...

Que assim sempre tem sido...

Ah ingrato...

Como será seu destino?


A noite, que o pesar...

Ao fim de cada dia...

Irá sempre me lembrar...

Que não sobrou nada...

Apenas cinzas frias...


Quero que saibas...

Se de súbito me esqueceres...

Também não me procures...

Porque já te terei esquecido...

O que outrora tenha sentido...


Minhas raízes sairão

em busca de outra terra...

A noite infinita enfrenta a vida...

Sem temer a ingratidão...

domingo, 4 de junho de 2023

Poço


 


Noite à fora...

Sobre uma navalha...

Ó divina esperança...

Sonho de criança...


O tempo a criar silêncio...

Tornando o sonho  poeira dos tempos...

Poço imenso e fundo...

Que engoliu meus desejos...


A ver no mundo seco a seca realidade...


Dos ébrios jogados à sarjeta...

Das matronas em penunbras das ruas da esquerda...

Dos pederastas em gargalhadas...

Disfarçando as lágrimas não jogadas...

Das mocinhas vendendo favores...

Em troca de licores...

Daqueles que só encontram alegrias...

Quando deixam suas garrafas vazias...


A vã loucura a moda é prima-irmã...

Mas quando vem o senso erguer-lhe os densos véus...

Desse desgosto...

Livrai-me Deus...


Salvo o meu desejar...

Teço beleza em tudo...


No hálito podre de um sugismundo...

No idoso porchetta...

Em quem que com qualquer um se deita...


Nessa langorosa magia...

Sob a lua que irradia...

As torpes paixões...


Sigo para meu descanso...

Aguardando, quiçá ...

Outro dia...


Valei- Deus...

Ou quaisquer outros guias...

Fim de noite...

Madrugada fria...


Eu próprio me interrogo:

– Onde estou? Onde estou?

E procuro nas sombras enganosas...

Sob essas horas mortas...

As mesmas coisas repetidas...


Inúteis os sonhos e as amarras

que nos prendem ao cais...

Mas quem sou eu que não escuto meus próprios ais?


Sandro Paschoal Nogueira

sábado, 3 de junho de 2023

Grãos de café

 



Era cedo...

Lavei e perfumei meu corpo...


O vento frio bateu no meu rosto trazendo-me a vontade de um café bem quentinho...


Existe um tempo certo para tudo...


Os amores são como os grãos de café na máquina de moer...


Primeiro um...

Depois outro...

E depois mais outro...


E todos vão para o mesmo destino...


Próximo? 


Sandro Paschoal Nogueira

Lisonja


 

Por fazer lisonja às flores...

Invejosas as estrelas para mim não brilham mais...


Um negro azul-cinzento...

De onde o oriente dorme...

Tardo sono...

Frio sem vento...

Silêncio que se ouve...

Coração vazio e mal que se sente...

De quando ama e não tem...


Que hei-de fazer senão sonhar...

Dia após dia...

Sentindo  tudo de todas as maneiras...


Mas a noite perdura uma calma de espanto...

Somente a lua na escuridão sussurrando...

-Podia ter sido amor,

e foi apenas traição...


O medo dará seu último vintém...

Nesse desassossego que me fustiga...

Pouco a pouco passando...

Minha incerta vida...


Tão negro o labirinto...

Ai de mim, que nem pressinto...

Em meu rosto pálido nenhum fulgor...


Não foi nada, não foi nada:

poderia ter sido amor...


Sandro Paschoal Nogueira


quinta-feira, 1 de junho de 2023

Vontades


 


O amor, o apego, o sossego...

Das almas calma...

É o meu o canto...


Vieram hoje dizer-me mentiras a meu respeito...

Diga lá companheiro...

Mostre-me o que tem no peito...


Só quero hoje a verdade...

Despida de vaidade...

Mentiras, fora daqui...

Deixai-me à vontade...


Vontade de sono no corpo...

Vontade de não saber de nada...

Apenas vontade...

De ficar longe das maldades...


Não sei aonde vou...

Nem vejo o que persigo…

Sou só um momento...

Deixai-me ser como sou...


Mistério alegre e triste...

De quem vive à parte...

Seguindo...

Sem temer as tempestades. 


Sandro Paschoal Nogueira