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sexta-feira, 22 de dezembro de 2023

Quisera


 

Ah quisera eu que as pedras não fossem mudas...

Que no fundo dos copos encontrasse as verdades...

Que as palavras fossem de fácil entendimento...

E que os amores não fossem desfeitos...


Quisera eu que meus pés descalços não fugissem...

Do tempo que a tudo destrói e forma fuligens...


Que as ilusões não se desfolhassem...

Que os sonhos não perdessem as virtudes...

E que amando só conhecessemos  as verdades...


Às vezes uma dor nos desespera...

E a verdade nos engana...

Então o desalento clama...

E a vida queremos que encerre...


Então para que nunca nada se perca...

O desejo cultivamos mesmo amargo e rude...


E diante das auroras que se avizinham...

Para que o sonho viva de certezas...

Para que o tempo da paixão não mude...

Por bem vos quero...

E morro despedido...

Na esperança de um vão contentamento...

Em saber que nem tudo está perdido...


Sandro Paschoal Nogueira

Papéis


 

Não há papel que conte a minha vida...

Eu caminho por eles...

Eu sei que há diferenças

E ainda bem que as há...


O meu desejo canta...

Onde estás?


O vento levará os meus sonhos?

A noite cai de bruços...

Como existir esquecimento ?

Mas o que vejo?

A luz escurecer...

A amargura de olhar e não ver...

O ter e o perder...


Vago dia após dia...

Estranha quimera...

Estranhas fantasias?

Quais ruas escutam meus passos?

Quais estradas colhem meu olhar?


Aos solavancos do destino...

Onde estarão aqueles que me embriagam de calafrios?


Os ventos recolheram...

E diante de mim...

Até as estrelas emudeceram...


Em mim a vida força sua invasão...

De onde vem a voz que me rasga por dentro?

Sem luz nem eco...

De onde vem esse aperto no peito?


Entro abandonado...

Nesses muitos corações que encontro desavisados...

Mortos aos caminhos...

Por onde insisto e também sigo...


Não quero ser quem sou...


Sandro Paschoal Nogueira

quinta-feira, 21 de dezembro de 2023

Pecado


 


Percebo afinal meu pecado...

Em silêncio mais profundo...


Faria piedade a toda a gente...

Esta pena, esta dor...

Este é o preço da vida e todo o seu valor...


Horas que perdemos...

Vão pelo espaço acompanhando os astros...


E todo este feitiço e este enredo...

Na luta dos impossíveis...

Tão profundo meu segredo...


Das profundas paixões...

Dor infinita...

De guerra e amor e ocasos de saudade…

Da alma o profundo e soluçado grito...

De que fui para ti só mais um neste vasto mundo...


Hoje triste ouço a solidão...

Da luz que não chegou a ser lampejo...

Da natureza que parou chorando...

Diante meu descontamento...


A vida é assim, uma ânsia…


Fazes o bem...

Que terás o mal por paga...


E o sonho melhor bem pouco dura...


Por tanto querer-te...

Recebi amarguras...


Pouco antes...

Nada agora...


E a princípio não percebi...


Como chegastes...

Partiste...

Mas levastes um pouco de mim...


Na profundidade dum desencanto...

Fiz-te doçura do meu coração...

Não compreendestes...


Mudarás, todos mudam...


Mais tarde em tua vida, um dia, hás de tentar

revolver da memória este tempo de agora…


E sentindo então o vazio...

Lembrarás do deixado para trás...


Não se vive outra vez...

E o tempo a tudo vence...

Fostes embora...

Mas fiquei em paz...


Sandro Paschoal Nogueira

Sede


 

Assim se desenterra toda a sede...

Todo o amor...

Todas as noites...

Uma a uma...

Toda a luz de cada dia...

E o meu coração que a ti espera...

Se alegra enquanto definha...


Vejo coisas que nunca antes tinha visto...

Coisas que sempre soube mas que nunca quis olhar...


Tão certo que me aperto...

Que meu mal tanto me dura...

Vou mais fora de caminho...

Sem ti vou tão deserto...


Recantos escuros, em segredo...

Atrás das sombras que me procuram...

Desiludido ainda me iludo...

No que meus olhos mais indagam...


Pelas palavras que nunca disse...

Pelos gestos que me pediste...

E com este cuidado todo...

Perco de vista o meu ser verdadeiro...


E bem sabes...

Que até me ignorando...

Sou teu...

Por inteiro...


Sandro Paschoal Nogueira

Procura

 



Sombra que segue os desejos...

Alma que tanto procura...

Sem encontrar... 

Em ruas, conversas vazias...

Fundo de copos se aventura...


Doidos passos incontidos...

Império dos sentidos...

Enfim o copo vazio...

- "Enche outra vez vizinho"...


Vinhas de vinhos de oiro não bebidos…

Ócios e sossegos…

Desejados e outros sentidos...


Noite sucedendo noite...

Vertigem em qualquer leito...

Tanto faz...

Tudo tem jeito...


Amores, esperanças e desejos...

Quase os mal diz...

Eis que entrega seu coração...

De nada serve e vale...

Tudo é ilusão...


Dias mal gastados...

Noites mal dormidas...

Desejos de coisas esquecidas...

Lembranças de velhas feridas...


Incansável a tudo retorna...

Rotina a que se entrega...

Fraqueza que vira resistência...

Quando qualquer hora e hora...


Mas pois por vosso mal seus males vistos...

E todos os dias finjes te-los esquecidos...


Já nem vives...

Nunca aprendeste...

Vem de sua saudade, o que presume...

A ânsia de realmente viver...


Dizes que ficas tonto…

Hás de então ficar louco...

Tonto, o feio fica bonito...

O corpo só arde em desvario...


No entanto, o imaginário

desejo de alcançar...

Já nada mais importa...

Nem mesmo se terá outro amanhã...

Ou se terá...

No dia seguinte se arrependido...


Sandro Paschoal Nogueira

Grande ilusão


 

Noite calada, como num lamento...
Foi cena alegre...
Oh quão lembrado estou...

Grande...
Grande Ilusão...
Perdida nos abismos da memória...

Pelas saudades que me aterram...
Durmo...
E o que importa?
Já não vivo em mim...

Chora o vento…

Noites sem brilho...
Noites sem luar...
Dolorido canto deste penar...

Meu olhar se pousou e se perdeu...
Mas por certo, a fé ardente...
Não perdeu a sua viva claridade e persiste...
E na volúpia da dor que me transporta...
Ainda insiste...

Sinto-te longe...
Ó esperança quase  morta...

Entre esses vultos falantes porém mudos...
Sou eu mais do que eles...
Ou tenho igual fado?

Um soluço subindo a eternidade...
Coração...
Coração...
Nas veredas da vida a alma não cansa...

Alongo os vacilantes passos...
Sob o julgo do tempo...
Ergo o cálice e blindo...
Sorvendo sublime veneno...

Sangue...
Luar...
Distantes saudades...

Sandro Paschoal Nogueira