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domingo, 13 de abril de 2025

Babel


 

Tenho os lábios secos...

Arde-me a cabeça...

Tenho febre...

Vejo o presente, e também o passado e o futuro...

E tudo me assusta...


Já nem sei mais o que digo...

Penso em deixar de pensar...


Trago perdido o que o espelho não mais retrata...

Sem o cortejo das estrelas...

Sem o que me enfeita...

Inocência...

Aonde deixei ficar?


Vens oh lua...

Espantas com o teu clarão as sombras que me perseguem...

Todos os lugares são o mesmo...

Com um coração que tem que pulsar...

Dizer a Verdade quem poderá? 


E do esquecimento inviolável...

Nas trevas sondo, fixo e absorto...

Interrogo o intrépido destino...

Além das cousas transitórias...

Das paixões e das formas ilusórias...


Em meu refúgio...

Continuo sonhando...

Onde me perdi...

Também me encontrei...

E dos cálices de absinto que bebi...

Nessa Babel velha e corrupta...

Muitos outros sei...

Que ainda os beberei...


Sandro Paschoal Nogueira

domingo, 23 de março de 2025

Inconstância


 

Deixados sobre a mesa...

Como os homens vivem...

Nem os deuses socorrem...

Os sonhos, as esperanças e ilusões...

Como um deserto imenso...

De conversas vãs...


Da enorme dor humana...

Que todos fingem não ter...

A essência de ser e parecer...

Conduz ao purgatório...

Sem ninguém perceber...


Vácuo imenso e fundo...

Eterna busca...

Inconstância do homem de ser...

Responde sorrindo à cruel realidade...

Enquanto perde-se no horizonte...

Acreditando crer...


A terra cumpre sua promessa...

De tornar a todos iguais...

O bom, o mal...

Quem riu, quem amou...

Que chorou os seus ais...


Nem este falso silêncio...

Sobre os ombros nus

e esmagados...

Nem o luar...

Pode esconder os pecados...


Raro e vazio dia.

Noite desamparada...

O momento é tão fulgaz e rápido...

Até para o mais amado...


Sandro Paschoal Nogueira

sábado, 15 de março de 2025

Perdido


 

Me fizeste sofrer e esperar...

Quando as emoções me afogavam...

A namorar as estrelas...

Pelas desertas ruas...


Quantas e quantas vezes...

Embriaguei-me te esperando...

E na surdina sem te encontrar...

E já descrente perdi-me com outros em qualquer outro lugar...


Cada um sabe o quanto que está sozinho...

E olha a tudo com olhos de sonho...

E aspira em silêncio os próprios ais...

Fazendo de conta ser tão feliz...

Enganando-se e querendo mais...


Oh dôce luz...

Oh lua que me contempla...

De engano em desengano...

Sou do que fui...

Um reflexo vago...


Confesso...

Entrego a ti meu abandono...

Em suas mãos me entrego...

Entrego a ti...

Porém, eu me dedico...

E prometo-me amar sem fim...


Mas não me faça...

A ti tanto esperar...

Já por destino derradeiro...

Podes perder-me...

E nunca mais me encontrar...


Sandro Paschoal Nogueira

Diabo loiro

 



Gemendo, a terra inteira...

Por onde o sonhador passa...

Fizeste-me mil maldades...

Com que a sua alma se alimenta...


Porque verdadeiramente sentir é tão complicado?

Como o mal feito está feito...

Agora a ti...

Verei como degradado...


Que somente a mim...

Andando...

Fingindo-me enganado...

Sobrevivi...

A tua falta de cuidados...


Amigos que pensam confundir-me

Eu tenho pena...

Que tentam destruir-me...

O mal por si, aviso, não se sustenta...


De haver falhado em  tudo...

Como tropeçar no capacho...

Que esconde as sujeiras do mundo...

Erro ao acaso...

Será o fado?


À imagem do meu próprio desejo...

Ser tolo é uma arte...

Abrigar fel no peito...

Até tanto que não sente...

Enquanto arde...


Pastoreando hei de viver...

E o diabo loiro, como me chamava...

Há de prevalecer...


Sou eu, eu mesmo...

De tudo qual resultei....

Fizeste por ti merecer...

Mudei...

Passei...

E sem ti descobri...

Que posso bem viver...


Sandro Paschoal Nogueira

quarta-feira, 12 de março de 2025

Preto e branco


 

Todo esse tempo que lá vai...

Vejo passar a minha vida...

Em preto e branco...

Em branco e preto...

Por alta noite...

Quando não ouço um pio...


Os meus amigos onde estão?

Que batam à porta...

Façam-se chegar...

Mas apenas espero você...

Por onde andarás?


Vem...

Destruir o silêncio...

Levantar os panos...

Limpar o espelho...

Que de tanto o fitar...

Preto no branco ...

Cinza está...


Deixada sobre a mesa...

Cheia de negra poeira...

A estrela por ti colhida...

Se empequena...


Tudo está lá fora...

E tanto aqui dentro quero...

Sentado...

Aqui espero...


E ponho-me a olhar suspirando...

Aguardando que se abra a porta...

E eu, que não sou mais do que isso...

É só isso o que me importa...


Tendo idéias e sentimentos por os ter...

Do que julgo que sou…

Do que anseio ser...

Sei que nada sou...

Quando estou longe de você...


Sandro Paschoal Nogueira

Por quê?

 



E vinha vindo a noite por entre os pinheiros...

E vinha a sonhar...

E perguntava-me ...

Por que te devo amar?


Porque há vida...

A doer com as mágoas...

A rolar as lágrimas...

Por que andas de repente...

Entre idas e voltas...


Dos que esperam a luz...

Em densas trevas...

No vácuo mudo...

De um desolado coração...

De quem não espera...

A sua compaixão...


Do esquecimento inviolável...

E olvida, como quem está já morto…

E, interrogando o destino...

Sente desconforto...


Verdade...

Qual delas?

Que estão além das cousas transitórias. ..

Correr do tempo onde o amor se perde...

Para onde vais...

Sem eu poder ficar?


Sandro Paschoal Nogueira

domingo, 23 de fevereiro de 2025

Estranhezas

 



Não há rumor na terra....

O silêncio se abriu...

As feras se aquietaram...

Em direção ao pó os corações jazem nas sombras...

De mãos em arcos os anjos oram...


Onde estão os inocentes?

Aqueles apontados por dedos tortuosos...

Cadê as flores que foram pisoteadas pelos hipócritas?

Onde estão as vozes que foram silenciadas pelas bocas amaldiçoadas?


Ao levantar do vento...

De ser todo só o meu exterior olho e choro...

Mesmo que eu ouça só esse estranho zumbido...

Vendo cair os pássaros...

Em meu coração emudecido grito...


Nas pessoas que passam na rua...

Com elas não me identifico...

E só lamento...

De ver o amor tornar-se perdido..


Cada um perdido no próprio sonho...

Até no sorriso que vem e que vai...

Todo mundo é convicto...

Dos próprios ais...


E eu, que não sou mais do que eles...

Volto a olhar para tudo...

Como antes do amanhecer...

E faço-me, assim crer...

Que bastaria apenas mostrar...

Minha alma num olhar...

Para tudo diferente acontecer...


E o mais estranho do que todas as estranhezas...

É que as cousas sejam realmente o que parecem ser...


Sandro Paschoal Nogueira

Buscas

 



A namorar as estrelas...

Traz luto nos seus vestidos...

Anda sempre a imaginar...

O que está sempre a sonhar...


Contente do instante...

Faz dos desejos um mirante...

No peito entrelaça...

A vontade de expandir suas asas...


Enche de força o coração...

Quando não lhe dão outra opção que um não...

Sussurra ao vento...

O que lhe diz o coração...


Sonda, fixo e absorto...

Desprezando  o seu tormento...

E interrogando o destino...

Busca seu momento...


Sabe que nada está além das cousas transitorias...

Das paixões e das formas ilusórias...

É a senha da sua vida...

No transcorrer das horas...


Foge e esconde...

E se tarda o encontro e não encontra...

Chora e ri da própria sorte...


Sozinho e acoplado a outros sozinhos...

Anda pelas ruas de espírito despido...

No gesto, no calar, no pensamento...

Finge estar desatento...


Uma presença...

Uma saudade...

Uma vontade...

E assim caminha...

Sonhando tocar as estrelas...

Desejando a eternidade...


Sandro Paschoal Nogueira

Aprendizado

 



Não falarei de minha poesia.

Não rimarei minha angústia...

Não direi que o mundo vai acabar...

Não direi da vida persistente que renasce...

De todos os truques...

De todas as formas de amar...


Sabes tu dizer que não?

Reprimir os maus, fazer aos bons justiça?

Sua ocupação dormir, comer, trepar...

Ignorância, desmazelo, incúria...

Hipocrisia que finges não ter...

A quem contigo não preocupas...

Mas que desejas agradar...


Todo esse tempo que lá vai...

Vejo passar a minha vida...

O que construí...

O que tenho...

O que senti...


Fecho as portas...

Fumo, e às vezes choro...

Tenho amigos que pensam confundir-me...

Outros tantos jurando me enganar...


A noite negra, irmã do desespero...

Faz-me apelos...

Adormecendo o pensamento...

Escondendo meu sonhar...


Importa amar, sem ver a quem?

Por mim, bem sei...

Que hei-de aceitar o que vier...

Embriagado os sentidos...

Não hei de recusar...


Tantos que vivem sobrevivendo...

E pergunto o sentido de tal sofrimento...

Nesta localidade da cidade…

Onde vejo tantos copos cheios...

Tantos jovens drogados...

Buscando algum sentido...

De crescer em alma e espírito...


Fujo da morte...

Embarcando à vida...

Enquanto me sussurra o vento:

-Tudo faz parte de seu espaço e tempo..

-Tudo é um aprendizado...

-Deleite-se nesse singular momento...


Noite perdida...

Quiçá o dia será encontrado...

E sigo minha estrada...

Enquanto medito sobre o dito...


Perante esta única realidade...

Perante meu abismo...

Cujos olhos me fitam...

Sufoco o angustiante grito...

Será somente isso?


Natureza diáfama...

De tantas almas...

De tantas histórias...

A eternidade seria assim?

Viver a cada uma...

Um constante experimentar sem fim?


Sandro Paschoal Nogueira

Obrigado


 

Muitas vezes te esperei...

Perdi a conta...

Nada me importava...

Mas tu enfim me importavas...

Bem mais do que as estranhas horas...


No meu mundo interior ...

Tivesse mais que perder...

Tanto pó acumulado...

Optei por fechar, do coração, a porta...

Deixaste meu espírito conturbado...


Em mim se despojou todas as jóias raras...

Nem ave canta...

Nem mais susurra o vento...

Erros e cuidados...

Perdidos momentos...


Quando quis me deu de graça...

Mas é caro o seu barato...

Depois que minha esperança morreu...

Me vi contra o tempo ingrato...


Ah como eu quis tanto amar...

Enquanto tu apenas brincar...


Deixaste perder o quanto tinha...

Tudo pus em suas mãos...

Fizeste de conta que não sabia...

E enquanto eu sofria...

Perguntava-me o que eu queria...


Do que dei da vida minha...

De ti ingratidão eu recebi...

Antes que nada me deste...

Só tua fútil e vazia companhia...


Tento reconstruir na minha imaginação...

A ilusão destes dias...


Cada um sabe que está sozinho...

Ah, perante esta única realidade...

Digo que muito aprendi contigo...

Diante do que agora sinto...


Obrigado...

Ensinaste-me a viver...

E agora o que tenho em meu olhar...

Tu nunca irá compreender...


Sandro Paschoal Nogueira

domingo, 16 de fevereiro de 2025

Estranheza

 



Não há rumor na terra....

O silêncio se abriu...

As feras se aquietaram...

Em direção ao pó os corações jazem nas sombras...

De mãos em arcos os anjos oram...


Onde estão os inocentes?

Aqueles apontados por dedos tortuosos...

Cadê as flores que foram pisoteadas pelos hipócritas?

Onde estão as vozes que foram silenciadas pelas bocas amaldiçoadas?


Ao levantar do vento...

De ser todo só o meu exterior olho e choro...

Mesmo que eu ouça só esse estranho zumbido...

Vendo cair os pássaros...

Em meu coração emudecido grito...


Nas pessoas que passam na rua...

Com elas não me identifico...

E só lamento...

De ver o amor tornar-se perdido..


Cada um perdido no próprio sonho...

Até no sorriso que vem e que vai...

Todo mundo é convicto...

Dos próprios ais...


E eu, que não sou mais do que eles...

Volto a olhar para tudo...

Como antes do amanhecer...

E faço-me, assim crer...

Que bastaria apenas mostrar...

Minha alma num olhar...

Para tudo diferente acontecer...


E o mais estranho do que todas as estranhezas...

É que as cousas sejam realmente o que parecem ser...


Sandro Paschoal Nogueira

sábado, 4 de janeiro de 2025

Pastoreio


 

Há de viver, pastoreando...

Com coração jovem, ousado e arejado...

À coroa de espinhos dos sentidos...

Onde o luar o banha...

Suavemente ofendido...


No silêncio sob os lábios frios...

Ninguém está a escutar...

O sacro se mistura ao profanos...


O tato que devora, sem dó nem piedade...

No dispersar dos anos...

Perde a consciência...

Sem hora, nem idade...


Na madrugada que ronda...

Sem rumo, sem afronta...

Fatigado de estar, sem força, nem fumo...

Sob tudo que fez, sem glória nem fama,

Do medo que perdeu, sem dor nem chama...


Quando a noite vem...

Com sombras profundas...

Por Deus, pelos Poetas, pelo mundo, clama...

Eu a si pergunta:

-Valeu?

O silêncio responde...

E o eco da voz, sem resposta...

Se desfaz ao vento...

Que o abraça...


Em meio à escuridão...

Sem luz, nem guia...

Busca respostas...

Mas só encontra sombras frias...


Só o eco dos seus passos...

Sem destino, nem meta...

E o vazio que o  consome...

Sem paz...

Sem ser clemente...

Para ele, de frente, sorri...


Na solidão da alma...

Onde sombras dançam...

Procura a luz...

Procura colo...


Mas só encontra trevas que o cercam...

E ainda assim, continua buscando...

Um sentido...

Uma razão para viver...

Para sonhar...

Para ofuscar o seu sofrer...


Sandro Paschoal Nogueira